A DICOTOMIA DA DOR E A NOSSA CAPACIDADE DE LIDAR COM ELA

Publicado: julho 31, 2014 em Uncategorized

DORQuero falar um pouquinho sobre um assunto que muitos não desejam abordar e, por isso estou certo de que esse será um texto que poucos lerão.

Meu assunto hoje é a dor. Quero falar-lhes mais precisamente sobre a DICOTOMIA DA DOR E A NOSSA CAPACIDADE DE LIDAR COM ELA.

Mormente a impopularidade do assunto ele é pertinente, porque não estamos livres de sermos alcançados pela dor em algum momento da vida ou em vários.

Clarice Lispector, ironizando esse “lugar comum” da dor, disse assim:

“Um amigo me chamou pra cuidar da dor dele, guardei a minha no bolso. E fui.”

Ao nos depararmos defronte a alguém que amamos muito, que está lidando com uma angustiante enfermidade num incômodo e desconfortável leito de sofrimento nós somos lembrados, da maneira mais sórdida e cruel, da dicotomia da dor e a sua ambivalente ação. Definitivamente, o que dói na carne de alguém querido dói também, profundamente, em nossa alma. Essa ambiguidade da dor nos faz transitar pelo calabouço escuro, úmido e gelado da concreta dor da carne, e pelo escorregadio limbo da subjetiva dor da alma.

Nesse trânsito sôfrego pelas trilhas da ambivalente dor nós perambulamos atônitos, sem muito entendimento, necessitados de compreender o incompreensível, sem poder dar nome ao indizível, e nos surge vorazmente o imponderável, Por quê?DOR 1

O grande poeta Mario Quintana, ao lidar com suas dores, disse algo tão simples, mas com tanta profundidade, que se procurarmos por um breve momento nos colocar no seu lugar e imaginar o que ele estava passando e a angústia que sentia, vislumbraremos muita coisa. Ele disse assim:

“Se eu pudesse, pegava a dor, colocava-a dentro de um envelope e devolvia ao remetente.”

Desejar a compreensão da ambígua dor é como desejar a explicação concreta da saudade, ou querer formular uma justa definição pra ela, ou mesmo explicar os fundamentos da sua existência. Aliás, dor e saudade são dois sentimentos que convivem muito de perto e frequentemente, mas uma explicação convincente sobre elas está longe dos nossos lábios.

Mas voltando à ambiguidade da dor, e ao desejo de entender o sofrimento por ela causado, entendo que ele se acentua mais na medida em que a dor que recrudesce a carne e dilacera nossa alma, gera em nós uma perplexidade que somente teremos forças pra lidar se tivermos uma ajuda externa e poderosa, a ajuda de Deus. Sim, certamente conviveremos melhor com a dicotomia da dor se considerarmos as palavras dAquele que mais entende dela, o nosso Criador!

DOR 4Deus convive com a crudelíssima dicotomia da dor desde os tempos eternos, e sempre foi impossível pra Ele não ver e não sentir o padecimento do seu unigênito filho. Desde a eternidade Ele convive, literalmente, com a dor e sua ambiguidade, porque Ele e o filho são Um e sofrem os dois lados dela.

Se a dor é ambivalente, então o nosso Deus a experimenta em todas as suas vertentes e nuances. Levando em conta a Sua triunidade Ele sofre a dor da carne dilacerada do corpo do Seu filho, que foi cravado com uma lança, e pendurado numa cruz, e sofre também em sua alma, no mais profundo dela, a indecifrável dor da morte agonizante do Filho.

Quando consideramos que Deus sofre, e que não há ninguém que entende mais de dor do que Ele, então aprendemos coisas importantes e fundamentais demais para uma sobrevivência equilibrada, que nos permitirá prosseguir com condições de dar seguimento à vida que temos pela frente.

Quando lemos no livro do profeta Isaías, no capítulo 53, que o Senhor Jesus era “…homem de dores e que sabe o que é padecer”, DOR 5essa verdade inunda o nosso ser e horizontes maravilhosos, coloridos e cheios de consolo e paz descortinam-se para aqueles que estão convivendo com a dor e o sofrimento que ela trás!

Quando o mesmo profeta Isaías, no mesmo capítulo 53, diz que o Senhor Jesus “…tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou sobre si”.  Então a alegria indizível e cheia de glória, e a bendita felicidade tornam-se nossas companheiras inseparáveis! A dor não é menos intensa, mas a esperança nos dá força, e a fé nos mostra que venceremos apesar da dimensão tão ampla da nossa angústia.

Quando o autor da Carta aos Hebreus diz: “Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado”, nós somos tomados por um ânimo gigantesco, e a confiança nAquele que não é homem para mentir, torna-se o motivo da nossa alegria e a razão do nosso intenso desejo de viver. Deste ponto em diante a inextinguível chama do Seu maravilhoso Espírito, tão necessária para por fogo em nosso coração e nos permitir viver confiadamente os restantes dos nossos dias em meio aos sofrimentos vindouros, surge vigorosa, toma todo o nosso ser, enche o nosso coração de gozo e nos lembra: não pereceremos!

DOR 6Por fim, quando João, nas suas revelações do Apocalipse, nos diz: “E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram”, então, mormente ao sofrimento, eu não temo mais nada nessa vida, pois pra onde vou não haverá mais dor, muito menos, a ambivalente dor!

A dor física lancinante, recrudescente, que subtrai o vigor daquele que eu amo e ao mesmo tempo dilacera a minha alma, terá ficado para trás, terá sido jogada no inferno e no lago de fogo, lugares que são absolutamente apropriados pra ela.

Que alívio!

Pr. Élio Morais

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comentários
  1. Wellington Campos disse:

    Nos idos anos de 1992, em 06 de outubro, o câncer de colo do útero vencera a batalha entre a vida e a morte e ceifou a vida da minha grande mãe (a 1ª grande mulher da minha vida). Saudades eternas, dores profundas e calejadas.

    Um pouco antes me veio uma onda de medo em sofrer quando o dia da minha partida chegasse. Pedia a Deus para morrer como um passarinho ou como no gesto de desligar o interruptor no apagar de uma lâmpada.

    Certo dia ouvi a minha mãe gemer a noite inteirinha, bem baixinho, para não acordar os seus filhos. Já em estado terminal pela moléstia do CA, a levamos ao hospital e ali descobrimos que o médico que tratava dela havia esquecido 60 cm de sonda dentro do seu intestino, numa cirurgia repentina e sem avisar a ninguém da família. A dor daquela Mulher era porque estava evacuando tal sonda. Em outro exame de Raio X fizemos uma descoberta maquiavélica e não seria exagero dizer diabólica: estava faltando um rim e a explicação do médico era que a doença havia “comido” esse órgão. Na verdade ele o comercializou… por questões várias, decidimos dar um tratamento digno à nossa mãe, por isso, não processamos ninguém e o tratamento médico perdurou até os últimos dias de sua vida. E ela se foi…

    Inesquecível!!! Não o episódio do médico larápio, mas, a dor da perda, a saudade que graças a Deus nunca se esgota, o amor que só aumenta e a esperança de revê-la no lar eterno, pois, diz a palavra: “crê e será salvo: tú e a tua casa”.

    Lendo o artigo acima, sobre a “DICOTOMIA DA DOR E A NOSSA CAPACIDADE DE LIDAR COM ELA”, essas lembranças me vieram à tona. Mas, incrivelmente me fez lembrar também da lição que marcou a minha vida: se o meu Salvador sofreu pelos pecados do mundo todo, particularmente dos meus pecados, alguns deles só confessados no quarto, entre Ele e eu e mais a ninguém, bem como, pelo sofrimento da nossa mãe, aqui resumidamente ventilado, então, miserável homem que sou ao pleitear à Deus uma morte maravilhosa, sem sofrimento, como no esbarrar do dedo em um interruptor de uma luz!

    Agora, do jeito que vier o meu fim nesse plano e a continuidade noutra seara, pode ser da maneira que Deus quiser. Estou resignado. A ´forma da morte terrena é apenas uma desculpa para o desencarnar desta vida para que o portal da eternidade seja vislumbrado e oportunizado para os escolhidos de Deus. Disse Jesus: “vou preparar-vos lugar, pois, na casa de meu pai há muitas moradas”.

    Um grande abraço e muito obrigado pelo alimento espiritual. Fique em paz! Do irmão em cristo, Wellington Campos

    • Querido irmão e amigo, Dr. Wellington,

      Li o seu comentário e me emocionei bastante. Sobretudo, a minha emoção vem pela foto de saber que não guardas nem um rancor no seu coração por tudo que viveu naquele período de sofrimento e, muito pelo contrário, tens dentro dele a viva esperança.

      Você, como bom advogado que é, faz excelente uso das palavras. Sugiro que crie também um blog e compartilhe com seus amigos e irmãos muita coisa que, certamente, nos será muito edificante.

      Deixo-lhe o meu fraternal abraço!

      Pr. Élio Morais

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