Nestas últimas semanas, em função da greve dos policiais militares no Estado do Espírito Santo, contemplamos cenas horríveis de baderna, saques e assaltos nas ruas. Nos vários telejornais pudemos ver adolescentes, jovens, senhoras idosas e, até mesmo mulheres grávidas invadindo as lojas da cidade e roubando aquilo que encontravam pela frente.
O que impressionou a muitos foi a percepção de que não se tratava de bandidos fazendo um assalto, mas, sim, de pessoas que, motivadas pela facilidade da oportunidade, provavelmente esqueceram de alguns valores que tinham e, ou, descobriram que não os tinham.
Daí surge-nos então a pergunta: A ocasião, de fato, faz o ladrão? O ser humano tem sim que corresponder a qualquer tipo de oportunidade? É verdadeira a afirmação de que mais cedo ou mais tarde todo ser humano mostrará a sua natureza decaída? O mau comportamento acontecerá inadvertidamente se a oportunidade for desmedidamente favorável?
Fosse isso verdade o que poderíamos dizer das pessoas que em meio aquela baderna toda manifestaram a sua decepção e a sua frustração com os atos de vandalismo e de selvageria? O que poderíamos dizer dessas pessoas que também estavam sendo alcançadas com a oportunidade, mas que se declararam totalmente contra aquilo que estava acontecendo? Elas não deveriam estar praticando os mesmos atos? O que as fazem diferentes? Porque uns entram no jogo e outros não?
Alguém disse com certa dose de sarcasmo que “A ocasião faz o furto. E que o ladrão já nasce feito.” Isso certamente fora dito para justificar o fato de que uns independentemente da oportunidade não cometem um delito, enquanto que outros sim.
Como pastor, eu quero dar uma visão teológica desta situação que, confesso, mexeu comigo nesses dias e vou começar com uma afirmação do apóstolo Paulo, em sua carta aos romanos, no capítulo 2, versos 14 e 15:
“Quando, pois, os gentios, que não têm lei, procedem, por natureza, de conformidade com a lei, não tendo lei, servem eles de lei para si mesmos. Estes mostram a norma da lei gravada no seu coração, testemunhando-lhes também a consciência e os seus pensamentos, mutuamente acusando-se ou defendendo-se.”
Entendo claramente que apesar das evidências inequívocas de que o homem é um ser decaído, que carece da glória de Deus, que pende para o mal sempre, que herdou do inimigo de Deus a sua natureza pecaminosa ao aceitar a sugestão de comer do fruto que Deus proibiu, esse mesmo homem acaba sendo indesculpável porque ele não é um bruto sem razão, ele não é um ser bestializado sem raciocínio, muito pelo contrário, ele fora feito a imagem e semelhança de Deus e, mesmo com a sua natureza decaída Deus o criou e lhe deu mecanismos para permitir que ele vivesse em comunidade e com condições de vida respeitosa entre os seus pares.
Facilmente observável é que nas culturas mais remotas e desprovidas de convívio e a influência de outros povos, e certamente eu estou falando de leis que regem outros grupos de pessoas, observa-se que mesmo entre esses que jamais tiveram contato com regras e preceitos a noção do que é certo e errado está sempre presente.
No texto que cito do apóstolo Paulo fica absolutamente claro que é inerente a este ser decaído, ou seja, existe dentro dele uma lei colocada por Deus que lhe dá condição de não ser refém da oportunidade. Há uma lei dentro de cada ser humano que, podemos dizer, é um juiz que não pode ser comprado, chama-se CONSCIÊNCIA e que fora colocada por Deus para que os homens vivam com um mínimo de vida respeitável em sociedade.
Jamais aquelas pessoas poderiam dizer que estavam fazendo aqueles saques porque a oportunidade foi muito maior que a capacidade deles de resistir! Aceitar tal afirmativa seria, de imediato, jogar a culpa no Deus criador, no Deus que legisla e condena os delitos cometidos.
Certa vez, o grande pensador e filósofo, Friedrich Nietzsche, disse o seguinte: “O medo é o pai da moralidade.” Jamais saberemos com certeza o que estava em sua mente quando ele afirmou isso, mas eu poderia dizer sim que há uma grande verdade nessa afirmação. Numa visão teológica, entendendo esse medo como o temor ao Senhor e aos seus princípios, e eu posso dizer, sim, que esse temor, princípio da sabedoria, muito provavelmente levou e levará muitas pessoas a não cederem jamais às suas concupiscências por causa da facilidade da oportunidade.
A ocasião jamais deve fazer o ladrão! Independentemente das pessoas conhecerem a Deus ou não, O reconhecerem ou não, acreditarem nEle ou não – todas são donas dos seus sentimentos, das suas reações, das suas decisões e por elas têm o ônus da responsabilidade.
Que Deus continue sendo misericordioso com o homem!
Pr. Élio Morais
Lindas palavras Elinho! Que Deus continue lhe dando sempre muita clareza e discernimento da sua vontade, pra que possamos ser edificados com palavras tão sábias!
Bjo. Te amo maninho!
Valeu, Helena! Vc é um estímulo pra mim!
Ai de nós se não fosse a misericórdia de Deus para conosco…
Fica difícil atribuir um culpado, se é que ele existe, por todo esse caos e barbáries que presenciamos naqueles dias atrás.
Como Defensora Pública, com certo tempo dedicado ao direito do consumidor, poderia relacionar esses comportamentos ao mal do nosso tempo: o consumo exacerbado.
Há um fomento diário pelo consumo, rotulam as pessoas pelos que elas têm, consomem ou “ostentam”.
As virtudes humanas parecem que sofrem um processo de especulação valorativa, quase que como ações numa bolsa de valores, ora têm altas, ora têm uma queda abissal.
E as carências das pessoas, que considero necessárias para constatar que não somos superiores a ninguém, cada vez mais perdem seu sentido e são supridas, momentaneamente, por coisas, e não mais por aquela busca do Divino.
Graças a Deus, ainda há muitas criaturas tementes a Ele, propagadoras de Suas obras e que servem de exemplo para outras criaturas mais carentes de fé.
Creio sempre, e muito, que o mundo será um lugar cada vez melhor, que ainda teremos pessoas para nos orgulhar e muitos corações serão transformados pelo exemplo dos bons.
Parabéns pela reflexão, Élio
Obrigada por nos fazer refletir!
Muito obrigado pelo excelente acréscimo, prezada Isabella. Suas pinceladas antropológicas e sociológicas contribuíram muito para minha visão teológica do assunto. Deus te abençoe e guarde!