A honestidade tem sido uma virtude cada vez mais escassa entre os homens. Numa linguagem popular poderíamos dizer que é uma verdadeira “mosca branca”, tal a dificuldade de encontra-la.
Na verdade não é fácil escrever sobre honestidade, são muitas nuances. Ela tem sido extremamente relativizada e o conceito sobre ela tem se deteriorado nas mentes confusas dos homens desse século XXI, que habitam este mundo pós-moderno e globalizado. Contudo, se faz necessário sim abordar o assunto em virtude da importância e relevância do tema.
Erasmo de Rotterdan, conhecido teólogo humanista do século XIV, já na sua época escreveu sobre como o relativismo apresentava as suas diversas facetas, ao dizer algo sobre a tentativa de se maquiar a honestidade, e que deve ser objeto de nossa reflexão, veja:
“É muito mais honesto estar nu do que usar roupas transparentes.”
Essa afirmação é de uma profundidade incrível, porque no afã de se fazer algo ruim ou mal, o ser humano é capaz de desonestamente atenuar uma atitude numa situação a fim de, pelo mesmo objetivo, lograr o êxito desejado noutra, ou seja, nesse caso, mostro minha nudez, que é o meu objetivo, usando roupas transparentes – uma maneira relativizada e maquiada de demonstrar o quanto somos desonestos.
Segundo o Dicionário de Significados, honestidade “é a qualidade de ser verdadeiro; de não mentir, não fraudar, não enganar, não omitir, não dissimular.” E o dicionário segue com a definição afirmando que: “o indivíduo que é honesto repudia a malandragem e a esperteza de querer levar vantagem em tudo. De maneira explícita é a obediência incondicional às regras morais existentes”.
Facilmente fazemos uma ligação do homem honesto ao homem que jamais subornaria, ou aceitaria o suborno de alguém, que jamais subtrairia qualquer bem material do outro, e com muita facilidade atribuímos honestidade ao homem que jamais deixaria de honrar seus compromissos, e isso não está errado, está apenas incompleto sobre o entendimento desse atributo que deveria ser marca registrada de todo o ser humano.
Confúcio, o famoso filósofo chinês, que viveu no período entre 551 a.C.-479 a.C., fez uma classificação no mínimo interessante entre três níveis de honestidade, veja:
“NÍVEL SUPERFICIAL DA HONESTIDADE: Inclui as ações que uma pessoa realiza com o objetivo de cumprir os seus próprios desejos, embora nunca escondendo a sua sinceridade.”
Ou seja, nesse nível o homem estaria agindo honestamente, pois não omitia o seu interesse em atingir seus objetivos pessoais – ele os admitia explicitamente. Algo tipo os fins justificam o meio. Posso não estar cem por cento honesto, mas o meu objetivo é nobre.
“NÍVEL INTERMEDIÁRIO DA HONESTIDADE: O homem não procura explicitamente satisfazer ao seu próprio interesse, mas antes o princípio moral da justiça com base na reciprocidade.”
Ou seja, nesse nível o homem seria um pouco mais nobre ou honesto, pois buscava a justiça, ainda que almejasse reciprocidade – a honestidade nesse caso residia no fato de não se querer o benefício apenas para si, tinha que haver benefício também para o outro.
“NÍVEL PROFUNDO DA HONESTIDADE: O homem trata o seu semelhante da mesma forma em que gostaria de ser tratado.”
Ou seja, nesse nível o homem seria totalmente honesto, pois a honestidade estava em querer o mesmo benefício para o outro. O grande problema desse nível é que nem tudo que é legal e trás benefício na relação entre as pessoas poderá ser necessariamente moral.
Particularmente, acho que o grande erro do famoso filósofo foi o de tentar classificar a honestidade, pois não consigo vê-la nos dois primeiros níveis, e acho extremamente arriscado aplica-la no terceiro. Na verdade, eu estou absolutamente certo de que não há honestidade nos três níveis simplesmente porque ela não pode jamais ser classificada. Honestidade existe ou não existe em determinado ato e isso deve ser encarado de forma totalmente absoluta! Acho impossível imaginar uma situação em que o um indivíduo foi pouco, médio ou profundamente honesto.
Todavia, quero me deter um pouquinho sobre o NÍVEL PROFUNDO DE HONESTIDADE, de que nos fala Confúcio, pois buscar para o próximo o que queremos para nós concorda plenamente com a declaração daquele que, pelos seus escritos, foi um grande exemplo de homem íntegro, e o maior autor dos livros da Bíblia, o apóstolo Paulo, pois quando ele fala sobre o cumprimento da lei, que seria o instituto que declararia alguém como honesto, ele vai dizer:
“O amor não pratica o mal contra o próximo; de sorte que o cumprimento da lei é o amor.” Rom. 13.10
E qual seria a melhor definição de honestidade, juntamente com as suas maravilhosas características, senão o tratado sobre o amor, que Paulo nos apresenta no capítulo 13 de sua primeira carta aos Coríntios?
“O amor é paciente, é benigno; o amor não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal; não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.”
Eis, portanto, o homem honesto: o homem que ama! E podemos afirmar com toda a certeza que a crise de honestidade que assola o mundo é uma crise de falta de amor, e não é sem motivo que o Senhor Jesus, o homem que mais demonstrou amor neste mundo, nos advertiu sobre a razão das enormes dificuldades que enfrentaríamos no final dos tempos:
“E, por se multiplicar a iniquidade, o amor se esfriará de quase todos” Mt 24.12
Das muitas virtudes do homem honesto, invariavelmente, uma que o acompanhará e trará felicidade para ele e para os seus pares é que ele não se conduzirá inconvenientemente. Isso que dizer, sobretudo, que ele não constrangerá ninguém, que ele será sobremaneira ético, que suas atitudes e procedimentos jamais causarão qualquer tipo de desconforto nas suas relações interpessoais.
A rigor, o homem honesto é um homem que não procura os seus próprios interesses, e não é porque ele não os tenha não, mas sim porque ele não os coloca acima dos do seu próximo, pois tem consciência de que não seria honesto, numa circunstância em que um benefício é de direito comum, usurpá-la do outro, seja em que situação for e do “jeitinho” mais delicado que se utilize.
O nosso grande problema é que temos sido desonestos com as “interpretações” que fazemos a respeito de nossas atitudes com as pessoas, e ao agirmos assim acabamos por corroborar com a teoria de Confúcio sobre a HONESTIDADE. O fato é que precisamos parar de interpretar falsa e desonestamente nossas atitudes erradas e acordar para o fato de que quando deixamos de amar, todas as características que nos tornariam pessoas virtuosas e muito felizes, deixarão de nos acompanhar e viveremos no limbo das consequências que uma vida desonesta trás.
Deixemos desse desejo de querer “inventar a roda”, dessa mania de “dar nomes aos bois” e nos apropriemos daquilo que o Senhor Jesus deixou para nós de forma tão clara!
Sejamos honestos, amemo-nos!
Pr. Élio Morais